Estou cansada de fantoches, de monocordistas, formatos limitados e retoques mal programados...
Move a perna para aqui, estica o braço até lá, recita mais baixo, pensa mais devagar... Segue para aqui, permanece acolá...
Farta desta fantochada em que reinam as parilisias faciais permanentes... Seguem-me os movimentos, perseguem-me os pensamentos numa ânsia de rotular aquilo que de mais secreto eu escondo...
Como se algum dia fosse possível saberem quantos fios de cabelo tenho, quantas palavras não disse e quantos defeitos faço questão de demonstrar a cada expressão facial, a cada comentário banal... Julgavam que não era feita de carne e numa tentativa frustada de sabotar a minha mente sabotaram também o meu corpo...
E da alma, já nem se fala... Por mais que faça questão de a colocar à prova todos os dias, esta na maior parte das vezes está de quarentena com receio de sofrer uma atípica invasão de propriedade... Numa contradição inexplicável o meu corpo foge da minha alma todos os dias com receio que esta fique obstruida pelo trânsito... Limitações, nada esporádicas, do nosso dia a dia por assim dizer... Só eu sei o quanto a mesma limitação é ampliável... Só eu sei que os refúgios são defesas às inseguranças que o corpo transmite aquele que é o maior segredo de cada corpo... O inviolável segredo dos corpos que, de quando em quando, se conhecem e se interligam nesse joie de vivre qui est l'amour.
Costumava eu dizer que a minha alma era mil vezes maior do que o meu corpo e que se estivesse a mil metros do chão a minha alma estaria certamente mil metros acima do céu... A convicção nem sempre nos faz ver com clareza os caminhos reais que traçamos, os objectivos que alcançamos e as frustrações que nem sempre ultrapassamos, as fragilidades outrora vistas como algo a temer acordam-me os sentidos para as reflexões ideológicas da minha alma.
A certa altura percebi que ao me despojar de tantas vivências abandonei a minha alma num qualquer esconderijo querendo acreditar que a ausência de mim permitiria, também, a ausência dos meus sentidos...
Acreditei que esta não me pediria nunca contas dos meus actos irreflectidos, dos meus pensamentos ingratos, da inconveniência natural à minha natureza, mas a verdade é que o sentimento de alienação encaminhou-me para uma fragilidade tal que me levou a crer que não há cura sem remédio e acalentou-me a alma saber que ser exigente comigo não invalida necessariamente ficar sempre aquém, mas sim além do que EU sou para os outros e não aquém das constatações dos outros em relação a mim... Ser exigente traz frustações, muitas frustações a nós, aos outros, às nossas relações com os outros e principalmente à insegurança que se sente a toda a hora...
Embora tente não consigo imaginar-me sendo de outra maneira, que não esta, que não desta forma, que mesmo não sendo exemplo para ninguém não me deixo tão somente reflectir num espelho semelhante a tantos outros...
Dói-me a alma só de pensar que, apesar de não estar só, sou mesmo só mais uma igual a tantos outros... Sem sal, sem cor e sem sabor... Sem ideias fugazes ou exigências utópicas, sem sonhos, sem dramatismos e sem comparações irracionais... É como comer uma maça sem caroço... Não conseguir distinguir a essência de cada alma é uma perfeita renúncia à nossa própria existência... To be or not to be... That's the question for today, tomorow, always! Enquanto viver deixem-me simplesmente ser eu!