Algures perdidas em textos, fotografias e pessoas não vejo maneiro de as encontrar, faltam-lhe as respectivas saliências… As concordâncias que fazem com que o verbo ser seja resultado directo do verbo estar… Elas andam por aí em telas nunca antes vistas e em pensamentos nunca imagináveis… Estão algures dentro de pessoas que eu não encontro, em pronúncias protegidas… Em miocárdios muito pouco explorados… Elas andam no privado.Deixaram-se de exposições desnecessárias porque quando delas se fala não há exposição que lhes valha… São modos, feitios, antagonismos, contradições ao vulgarmente actual… Deixaram-se dos apanágios e das estrondosas celebrações da sua existência… Já pouco se usam, raramente se vêm e pouco ou nada se sentem… De modo que a sua localização exige-se… É urgente encontrá-las e praticá-las como se delas dependesse toda uma existência… Deixemo-nos do amanhã serei ou do tenho sido, deixemo-nos de interiorizações ocas e desprovidas de conteúdo… Deixemo-nos de ser pessoas em p minúsculo e passemos a ser pessoas grandes com G maiúsculo… Passam-se minutos, horas, dias e meses em que as minúsculas evidenciam pessoas em tamanho microscópico com pensamentos à escala milimétrica… Perderam com elas os valores e passaram estes a ser pequeníssimas ideologias deprimentes… Esconderam-se os tesourinhos nos cofres da mente e resguardaram-se os mesmos das intempéries…Recearam confrontações desnecessárias e imposições utópicas nos ensaios do que é ser em SER maiúsculo… Fiquemo-nos pelos textos em minúsculas e pela ausência de pontuação… Passemos das letras às pessoas e deixemo-nos de divagações… Deixemos os sentimentos minúsculos e os interesses pessoais para quem de direito os valoriza e dirijamos por momentos as nossas atenções aos desaparecidos… Àqueles que de grande têm tudo e do tudo que têm evitam exibicionismos… Viver em arte é saber transpor histórias pequenas em conteúdos enormes, em pessoas com PERSONALIDADE e ALMA transformar valores em matérias de estudo teórico e prático… Deixemos os ensaios para ontem e os desejos para anteontem… Na verdadeira gestão do tempo ser está para o presente como o oxigénio está para a existência… É de maiúsculas que se precisa e de pessoas que nelas coloquem em prática todas as conjugações do verbo SER nos respectivos tempos.
"Não penses para amanhã. Não lembres o que foi de ontem. A memória teve o seu tempo quando foi tempo de alguma coisa durar. Mas tudo hoje é tão efémero. Mesmo o que se pensa para amanhã é para já ter sido, que é o que desejamos que seja logo que for. É o tempo de Deus que não tem futuro nem passado. Foi o que dele nós escolhemos no sonho do nosso absoluto. Não penses para amanhã na urgência de seres agora. Mesmo logo à tarde é muito tarde. Tudo o que és em ti para seres, vê se o és neste instante. Porque antes e depois tudo é morte e insensatez. Não esperes, sê agora. Lê os jornais. O futuro é o embrulho que fizeres com eles ou o papel urgente da retrete quando não houver outro."
Vergílio Ferreira, in "Escrever
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